Garantia Apenas para Motor e Câmbio: O Que Todo Lojista e Consumidor Precisa Saber

Ao contrário do que muitos pensam, a garantia de veículos usados não se aplica ao carro como um todo. A prática consolidada — e respaldada tanto por jurisprudência quanto por boas práticas de mercado — é de que a garantia legal de 90 dias (prevista no artigo 26, II, do CDC) incide exclusivamente sobre o motor e o câmbio. Isso mesmo: motor e câmbio, ponto final. Essa delimitação deve estar expressamente prevista no contrato de compra e venda, como forma de proteger o lojista de futuras distorções interpretativas e reforçar o dever de informação previsto no artigo 6º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor.

Dr. Reynaldo Villa Verde Junior

A Garantia em Veículos Usados é um Contrassenso?

Na minha humilde opinião — como advogado especializado em Direito Veicular — veículos usados nem deveriam ter garantia. A garantia, tal como concebida no direito do consumidor, é uma faculdade própria de produtos novos, que supostamente estariam livres de desgastes, vícios ocultos e uso anterior.

Contudo, é evidente que não seria justo permitir a venda de um veículo usado sem qualquer respaldo jurídico. Por isso, criou-se uma regra de equilíbrio: a garantia se restringe aos dois componentes que o consumidor comum não consegue inspecionar sozinho ou com facilidade — motor e câmbio. Para o restante do veículo, vale o Direito de Informação, aplicado com a vistoria do veículo pelo consumidor.

O Que é "Adequação Para o Uso"?

Adequação ao uso, como ensina o artigo 18 do CDC, é a obrigação de que o bem cumpra aquilo que se espera dele. No caso do carro, é simples: ele precisa ligar, andar e cumprir sua função básica de locomoção.

Se o carro possuir falhas no motor ou câmbio dentro de 90 dias da compra (ou 3.000 km rodados, segundo a média de uso nacional), a loja responde. Fora isso, o restante é questão de estado de conservação, que pode e deve ser avaliado antes da compra pelo consumidor.

O Papel do Checklist e do Contrato

É justamente para isso que serve o checklist de entrega. O vendedor, de forma transparente, faz uma inspeção visual com o cliente, apontando estado da lataria, pneus, estofados, pintura, vidros e todos os itens acessíveis. Essa prática, além de didática, cumpre o dever de informação e transparência (arts. 4º e 6º do CDC).

O checklist é, portanto, parte integrante da proteção jurídica da loja. Ele demonstra que o consumidor teve a oportunidade de verificar o veículo e concordou com seu estado de conservação, reforçando a ideia de que não há vício — mas sim uso anterior.

A Realidade do Pós-Venda

Mesmo com tudo documentado, o consumidor costuma retornar à loja por problemas fora do motor e câmbio: uma lâmpada queimada, um ruído no banco, uma trinca no vidro que apareceu dias depois. E é aqui que muitas lojas cometem um erro estratégico: cedem facilmente e “pagam para não ter dor de cabeça”.

A frase “doutor, eu prefiro pagar para não ter dor de cabeça” já virou um mantra entre lojistas de veículos usados. Mas ela custa caro. Ao agir assim, a loja assume responsabilidades que não são suas e cria no consumidor a falsa ideia de que qualquer problema deve ser resolvido pela loja, mesmo sem respaldo legal.

O Lojista Precisa Saber Dizer “Não”

A equipe da loja — especialmente quem atua no pós-venda — precisa estar treinada técnica e emocionalmente para sustentar o que está no contrato e no checklist. Dizer "não" pode ser desconfortável, mas é necessário para manter a saúde financeira e jurídica do negócio. E, claro, desde que esse “não” seja fundamentado em documentos, cláusulas e na boa-fé, ele é juridicamente defensável.

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